sábado, 8 de janeiro de 2011

Recanto

No canto da casa
fico sentado
olho de lado
pro canto da casa

No canto da casa
ouço o canto
Não canto da rua
mas canto da casa

No canto da casa
vem uma voz
do canto do mundo
do canto da casa

No canto da casa
cabeça, meu pranto
de choro infantil
do canto da casa

No canto da casa
imagino uma história
ilusão ou memória
do canto da casa

No canto da casa
a luz da janela
mas eu fugi dela
pro canto da casa

No canto da casa
não quero o canto
que invade os ouvidos
do canto da casa

No canto da casa
só vem martelada
a alma ilhada
no canto da casa

Escuto uma bomba
no canto da casa
que explode e implode
o canto da casa

A brisa chegou
no canto sem teto
e um canto discreto
me faz levantar

O canto da casa
virou melodia
que canta o canto
do canto da casa.

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Colisão

Vi o que tu fizeste
Falavas muito e nada
Ao mesmo tempo
Em tempo algum
Fonte jorrando enxurrada
E teu rosto brilhava
Tantos livros, croquis e discos
Estavas a brincar com fadas

Cálculos, Química, Física, filos
E a raiz de todas as palavras
Não só as horas e as estrelas
A Teologia também dominavas
O mundo ficava tão pequeno
Tu borbulhavas
Nadar o Atlântico, o Índico e o Reno
Fluindo em cascatas

Os braços em volta da Terra
Sublime devaneio sem erro
Sorrias do temor humano
Não vi o homem
Estavas além
O super homem
Não o de Nietzsche
Mas o que cai ante a kryptonita

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

As Feras

Subi a montanha para gritar
Soube da montanha falar e gritar
Aquele povo lá embaixo me ouviu
E aquele povo de baixo me viu

Virei um mosquito e voei até lá
Falavam do grito, o grito do louco
De cima do morro berrava, bradia
Gritando com a força da entranha que tinha

Estava orgulhoso de terem me ouvido
De doido me chamam depois do rugido
Mas eu não sou louco, jamais eu rugi
Tentei avisar dos leões que eu vi

Eles não me ouvem ou fingem escutar
Não querem os berros quando possa dar
Querem silêncio, que eu deite, que eu durma
Assim, desolado não faço besteiras

Então eles correm de um lado pra outro
Mordidas e urros, alertas do louco
Deitado sorrindo quietinho os ouço
Leões se fartando de quem me fez pouco

Assim depreciado, depressivo durmo
Não foi de um sonho que vieram as feras
Eles machucados e eu quase morto
Eterna criança, cuidados pro tolo

As feras se foram de barriga cheia
Não era de carne mas de alma alheia
Por fora intacto, inteiro, sem teia
Por dentro feridas deixadas da ceia